Bem me quer, mal me quer...
Muitas
vezes ouvimos expressões tais como: "o consumo de drogas é que faz com que
seja violento/a", "a Lei não me pode ajudar e a Polícia não está
interessada", "só as mulheres de meios sociais desfavorecidos sofrem
de violência doméstica", "quanto mais me bates mais gosto de
ti", "há mulheres que provocam os maridos, não admira que eles se
descontrolem", "têm que aguentar para não terminar o casamento",
"entre marido e mulher não se mete a colher", "a lei protege as
pessoas LGBTI e a Polícia não quer saber", entre tantas outras.
A
Violência Doméstica está envolta de alguns mitos, que têm servido para
"desculpar" a violência e o/a agressor/a e "culpabilizar" a
vítima. Estes mitos dificultam a procura de ajuda por parte da vítima e
contribuem para a falta de compreensão de terceiros/as sobre as reais questões
que estão no cerne da vitimação.
A
violência doméstica diz respeito a determinados comportamentos, utilizados num
relacionamento, por uma das partes, sobretudo para controlar a outra. As
vítimas podem ser ricas ou pobres, de qualquer idade, sexo, religião, cultura,
grupo étnico, orientação sexual, formação ou estado civil e todos/as podemos
ser vítimas de violência doméstica.
Todas
as pessoas que vivem (ou viveram) uma situação de Violência Doméstica têm
reações diferentes, em função de diversos fatores: tipos de abuso sofrido;
histórias passadas de abuso ou violência; estratégias utilizadas para
sobreviver ao abuso; outros fatores de stress na vida e/ou quotidiano; o apoio
(ou falta deste) que recebeu de familiares, amigos/as e serviços.
Qualquer
que tenha sido a sua experiência, recuperar de uma vitimação de violência
doméstica é recuperar de um trauma significativo. Terminar um relacionamento
abusivo pode ser um primeiro passo para o início de um processo de recuperação.
Existem
várias razões para uma vítima se manter numa relação violenta, mesmo que estas
possam parecer estranhas a quem não é vitima: não reconhecer o comportamento
do/a seu/sua companheiro/a como violento;
receio de ser discriminado/a; dependência económica e/ou emocional; medo
da reação do/a agressor/a; abandono dos seus pertences, casa, filhos/as,
animais de estimação; vergonha; perda do estatuto social; insuficiência de
força física e emocional para enfrentar situação de rutura.
O
Código Penal Português prevê e pune o crime de Violência Doméstica, que assume
a natureza de crime público, desde o ano 2000, o que significa que não é
necessário que seja a vítima a apresentar queixa, mas pode ser denunciada por
terceiros/as. Para apresentar uma queixa, deve
dirigir-se ao posto da GNR, a uma esquadra da PSP ou da Polícia Judiciária.
Também pode dirigir-se aos serviços do Ministério Público do Tribunal da sua
Comarca ou aos serviços do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses.
Neste processo é
fundamental que as vítimas utilizem os serviços especializados no apoio a
Vítimas de Violência Doméstica (VVD), tais como a APAV, Serviços de Informação
às VVD, que apoiam as vitimas de crimes, amigos e família, prestando serviços de
qualidade, gratuitos e confidenciais, tais como apoio jurídico, apoio
psicológico e apoio social. O apoio social é prestado por Técnicos/as de
Serviço Social, Educadores/as Sociais e outros/as profissionais da área social
devidamente qualificados/as para dar resposta às diferentes necessidades das
vítimas (habitação, alimentação, saúde, educação, emprego). A confidencialidade
e a escuta ativa à/ao utente são essenciais num atendimento e apoio adequado a
estas vítimas. Importa que a vítima se sinta ouvida, compreendida, num espaço
isento de juízos de valor e onde a sua vontade e decisões sejam sempre
respeitadas.
Carla Gamelas
Comentários
Enviar um comentário